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Floresta da Tijuca, por Gastão Cruls

Caminho do Excelsior, na Floresta da Tijuca
Caminho do Excelsior, na Floresta da Tijuca

A TIJUCA, CUJOS mananciais vinham cada vez mais sendo aproveitados para o abastecimento da cidade, fez com que em 1857 a atenção do governo se voltasse para as suas florestas. As fazendas aí abertas uns trinta anos antes e queimadas subsequentes tinham-lhe quase completamente acabado com a pujante vegetação. Urgia reflorestá-la. Essa obra, de que já cogitara o Ministro Conselheiro Felizardo de Sousa e Melo, só pôde, porém, ser iniciada em 1861, quando outro ministro do Império, Luís Pedreira do Couto Ferraz, Barão e, depois, Visconde do Bom Retiro, confiou ao Major Manuel Gomes Archer o grande trabalho de povoar com novas essências aquele pitoresco recanto da cidade. Para isso, Archer trouxe da sua própria fazenda – Fazenda Independência – no Morro do Cabuçu, limites de Campo Grande e Guaratiba, e também das matas que a vizinhavam, numerosas sementes e mudas dos mais vigorosos exemplares da flora fluminense. Assim, só num ano, foram plantadas, nos altos da Tijuca e das Paineiras, perto de oito mil árvores, preferentemente araribás, caneleiras, cedros, guarajubas, guaretás, guarapiapunhas, paus-brasil, jacarandás e jequitibás. Concomitantemente, foram abertos ou melhorados vinte quilômetros de estradas cavalgáveis, possibilitando aprazíveis passeios e até a moradia em pleno seio da natureza.

Mais tarde, em 1875, o Barão d’Escragnolle (Gastão Luís Henrique d’Escragnolle), nomeado administrador da floresta, prosseguiu com carinho a tarefa iniciada por Archer. Morando na própria Tijuca e conhecendo-lhe muito bem os sítios mais aprazíveis, foi ele que deu nome e facilitou o acesso ao Excelsior, esplêndido mirante, a seiscentos e onze metros de altura, sobre o fundo da baía. Devem-se-lhe também o embelezamento da Gruta de Paulo e Virgínia, das cascatas Gabriela e Diamantina e da fonte Piraiú. Algumas dessas designações prendem-se a pessoas que lhe eram caras. Gabriela era o nome da sua irmã, a Baronesa de Taunay, Piraiú é localidade do Paraguai onde lhe tombou em combate o filho único e estremecido, e o nome daquele belvedere de panorama tão soberbo, Vista do Almirante, foi dado em homenagem ao Vice-Almirante Teodoro de Beaurepaire, herói da Independência e do Rio da Prata.

Reportando-nos aos que se tresdobraram em zelos pelas matas da Tijuca, não pode ser esquecido o Barão de Taunay, Félix Emílio, filho de Nicolau Antônio Taunay, e seu residente por mais de meio século. Êste tudo o que por elas fez foi de espontânea vontade, por gosto próprio, inclusive a colaboração que emprestou ao seu colega na Academia de Belas-Artes, Job Justino de Alcântara, quando, em 1862, construiu a ponte que ainda lá está, defronte à Cascatinha, e conhecida por Ponte de Job.

Aliás, aos principais benfeitores dos altos do antigo Andaraí Pequeno, Visconde do Bom Retiro, Barão d’Escragnolle e Barão de Taunay, foi prestada homenagem em modestos monumentos que aqui e ali, entre o arvoredo acolhedor, lhes testemunham a gratidão dos cariocas.

Palacete do Conde de Itamaraty no Alto da Boa Vista
Palacete do Conde de Itamaraty no Alto da Boa Vista

Dizíamos acima que os caminhos adentrados pela floresta deram ensejo a que algumas pessoas de recursos abrissem suas chácaras debaixo da ramaria sempre verde e entre regatos buliçosos. Acodem-nos algumas: a do próprio Visconde do Bom Retiro, para os lados do Açude da Solidão; a do Dr. Tomás Cochrane, na Gávea Pequena, depois propriedade do Sr. E. G. Fontes, que a transformou numa das mais ricas residências do Rio; a do Conde de Itamarati, à Rua Boa Vista, depois um hotel do mesmo nome, e atualmente Abrigo Feminino do Juízo de Menores; finalmente, o Palacete Leopoldina, hoje Colégio Sacré Coeur, à Rua Ferreira de Almeida.

Na antiga chácara do Dr. Cochrane, sogro de José de Alencar, dizem que o nosso romancista escreveu alguns dos seus livros, entre os quais Sonhos de Ouro e O Sertanejo. Foi também aí que ele recebeu a visita de Castro Alves, recém-chegado da Bahia, que lhe trouxe uma carta de recomendação e lhe leu um dos seus trabalhos literários, talvez o drama Gonzaga.

Fonte

  • Cruls, Gastão. Aparência do Rio de Janeiro: Notícia histórica e descritiva da cidade. Prefácio de Gilberto Freyre, desenhos de Luis Jardim e fotografias de Sascha Harnisch. Rio de Janeiro: José Olympio, 1949. 2 v. (Edição do IV Centenário, 1965).

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Mapa - Floresta da Tijuca