Quinta da Boa Vista, por Ferreira da Rosa

Confinando com o 13.º Distrito (São Cristóvão), mas ocupando a Sudoeste do mesmo uma área de 1.033.800 m² pertencente ao 14.º Distrito (Engenho Velho), está o Parque da Boa Vista, esplêndido logradouro que foi Quinta Imperial, amplo terreno circundante do Palácio em que residiram sucessivamente El-Rei D. João VI e os imperadores D. Pedro I e D. Pedro II.
Esse Palácio fora antes, e em termos menores, propriedade e vivenda campesina do comerciante Elias Antonio Lopes que em 1808 fez a cortesia de pô-la à disposição do Príncipe Regente para morada condigna dos soberanos de Portugal. Em reconhecimento de tanta liberalidade o Príncipe agraciou o seu bom vassalo com o Hábito de Cavaleiro da Ordem de Cristo e o Foro de Moço Fidalgo; e, com a graduação de Alcaide-Mór, teve depois o Sr. Elias funções muito importantes na Corte de D. João.
Quando este se retirou do Brasil ficou de posse do palácio seu filho D. Pedro que, por sua vez, o deixou na posse de seu filho D. Pedro II. Era privativo da Família Imperial, com todo o terreno ao redor onde foram despendidos alguns milhares de contos; a última reforma fora realizada pelo grande jardineiro paisagista Dr. Auguste François Marie Glaziou que embelezou o Parque obedecendo a vontade do último Imperador.
A República incluiu a Boa Vista nos próprios Nacionais, e adaptou o Palácio para reunião do Congresso Constituinte, em 1890; mas não cuidou do Parque; a mudança do Museu para lá em 1892, também não o livrou do desprezo a que padecia condenado. O autor deste texto, n’“O País” de 12 de Março de 1896, descreveu o clamoroso estado de abandono a que chegara. Pouco se fez, entretanto: A União entendia que o tratamento do Parque devia ser municipal, e a Prefeitura que lhe não competia tratar das propriedades da União; Afinal, quando Presidente da República, em 1910, o Dr. Nilo Peçanha mandou efetuar obras de saneamento, nivelamento e embelezamento que andaram por 1.227:979$; e o Parque foi entregue à Prefeitura Municipal.
É hoje um dos mais vastos e formosos logradouros públicos da Cidade.
A sua entrada principal, com três portões artísticos de serralharia, ostenta-se fronteira à Avenida Pedro Ivo. Daí, em linha reta e plano ligeiramente inclinado, parte a Avenida Pedro II, 700 metros até o Museu. Na frente de sua entrada principal, encontram-se três portões artísticos de serralharia na Praça Virgílio de Melo Franco, que separa a Quinta da Boa Vista da Avenida Pedro II. Daí, em linha reta e plano ligeiramente inclinado, são 700 metros até o Museu Nacional – UFRJ.
Da área total do Parque 84.500 metros quadrados são de alamedas macadamizadas, 16.000 de passeios cimentados, 70.000 de bosques e arvoredos, 160.000 de gramados, 32.500 metros quadrados da superfície de lagos e rios; 3.680 no planalto ajardinado.
Das inúmeras obras de Arte destacam-se o interessante mármore da Escultora D. Nicolina Vaz de Assis “O Canto das Sereias”, e o “Templo em Ruínas”, bela colunata dórica sobre uma ilhota do grande lago.
De dia a paisagem oferece agradáveis perspectivas: Ruas extensas sob dosséis de verde fronde, vastos e veludosos gramados, caramanchões artísticos, lagos, rios, pontes rústicas, bosques, ilhas pitorescas, tudo se harmonizando num conjunto primoroso, exibindo, à porfia, todas as habilidades da arquitetura paisagista. Pode-se percorrer o Parque de carro. A pé levaria horas. Há recintos aparelhados e próprios para exercícios ginásticos e jogos atléticos. À noite a iluminação é profusa: O Parque da Boa Vista é um passeio encantador, a 10 minutos do Cais Acostável.
Num terraço, ou socalco, ou átrio, de 46 metros por 80, em nível, diante do antigo Palácio, estende-se, como uma alcatifa, gracioso jardim mosaico, ao centro do qual está desde 1910 o busto do Dr. Nilo Peçanha vazado em bronze. Balaustrada, jarrões, candelabros e estatuetas, bordam e esmaltam este quadrilátero que é por sua vez um esmalte do Parque.
A Prefeitura inaugurou neste Parque, em 12 de Novembro de 1910, um Aquário de água doce, simulando uma caverna calcária, e que atrai enorme concorrência de visitantes, curiosos e estudiosos. A fauna da água doce aí se mostra em 28 piscinas, como a da água salgada se mostra no Aquário do Passeio Público. Anexo ao Aquário do Parque da Boa Vista há um Laboratório de Piscicultura.
Também é resolução da Prefeitura fundar aqui um Jardim Zoológico para o que foram demarcados 18.000 metros quadrados. Já está como pórtico desse recinto uma colunata retirada do centro da alameda principal do Parque onde se achava desde 1825, oferecida a D. Pedro I por Sir Charles Stuart, Embaixador Inglês na Corte do Rio de Janeiro, e negociador do Tratado da Independência.
No dia 20 de Setembro de 1913 efetuou-se o lançamento da primeira pedra desse futuro Jardim Zoológico Municipal. O Jornal do Comércio do dia seguinte noticiou a solenidade. Durante, o ano de 1921 publicaram-se editais em Londres, Paris, Berlim, Nova York e Rio de Janeiro, para a sua construção; mas nada se adiantou.
Há ainda no Parque da Boa Vista um Horto Municipal – 145.000 m² com árvores, arbustos, palmeiras e plantas diversas e estufas e viveiros destinados a ruas, praças e jardins públicos.
Fonte
- Rosa, Francisco Ferreira da. Rio de Janeiro em 1922-1924. Rio de Janeiro: Typographia do Annuario do Brasil (Almanak Laemmert), 1924. 222 p. (Coleção Memória do Rio 3 - Reprodução).
Mapa - Quinta da Boa Vista