Passeio Público, por Ferreira da Rosa

Existe o Passeio Público desde 1783. Projetou-o o Vice Rei Luiz de Vasconcellos, tendo em vista acabar com o Boqueirão da Ajuda, feio lugar de despejos que infectava aquela beira-mar. Mandou, então, arrasar o Morro das Mangueiras que se elevava ali próximo, onde corre hoje a rua Maranguape; e, havendo com ele nivelado no Boqueirão uma área de 28.196 m2, incumbiu o Mestre Valentim de aproveitá-la com a sua graciosa habilidade de modo a oferecer ao público um logradouro pitoresco e higiênico.
E assim se fez.
Depois de por muitos anos ser ponto favorito de recreio e de refrigério para os moradores da Cidade, depois de ter sido teatro de solenes festejos populares e oficiais, o Passeio Público entrou em decadência, e chegou a verdadeiro abandono. Em 1817 tornou-se preciso amparar o terraço que desabaria solapado pelas ondas; e já se não restabeleceu tal qual era. Em 1841 foi o Passeio Público submetido a reformas, recebendo nesta última data o lago e o canal que ainda hoje tomam 1.825 m2 da sua superfície.
A área plantada é de 17.637 m2. Algumas árvores são da primeira época. Moderna é a fonte luminosa no meio do grande gramado central. Nas ruas do Passeio encontra-se a gente com vultos conhecidos: O poeta Gonçalves Dias, outro poeta, Castro Alves, e o jornalista Ferreira de Araújo, fino comentador das Coisas Políticas na “Gazeta de Notícias” que fundou e dirigiu até a morte.
Desde 1904 há no Passeio Público um Aquário com plantas e animais da baía do Rio de Janeiro. Das suas vinte piscinas quatorze, encerram, geralmente, peixes, e os outros zoófitos, crustáceos, moluscos e quelônios. Ao lado de cada piscina há quadros com os nomes das espécies á vista. Entre os zoófitos há sempre exemplares de Gorgonias róseas, várias actínias, ouriços, estrelas do mar, e algas verdes em torno de cuja rama o cavalo marinho, Hippocampus Guttulatus, não raro passeia a sua interessante figura. Nas paredes das piscinas, e sobre as grutas que servem de retiro aos peixes proliferam colônias de briozoários, vermes tubícolas, ostentando seus penachos branquiaes e retráteis, e atestando a excelência do meio artificial em que vivem.
O Aquário é um instrumento de ensino que o público frequenta assiduamente, e por onde deve desfilar a mocidade das escolas ao familiarizar-se com os primeiros rudimentos da História Natural.
Da primitiva fatura do jardim são as pirâmides de granito cobertas de hera, dedicadas por Valentim á “Saudade do Rio” e ao “Amor do Público” – delicadezas do seu espírito afetuoso; assim como o tanque encostado ao terraço onde a água há quatorze decênios murmura, caindo das mandíbulas de dois jacarés de bronze, também modelados pelo Mestre Valentim. No alto desse tanque, emergindo da folhagem que o reveste ainda se conserva em escudo de mármore o brasão heráldico do Capitão General de Mar e Terra Luiz de Vasconcellos e Souza.
O terraço do Passeio Público deixou de ser uma varanda sobre as ondas que se espreguiçavam na areia: Desde 1905 foi o mar dali afastado pela interposição da Avenida Beira-Mar. Em 1921-22 ainda maior aterro se lhe formou na frente; e, ao mesmo tempo que esquartejava o jardim, a Prefeitura levantava no lindo belvedere um edifício destinado a ser alugado para Cassino!
Recordando o período da nossa História em que se fez o Passeio Público ainda está de pé o Portão com as efígies de D. Maria I e de D. Pedro II num medalhão de bronze dourado, reverso do que ostenta o moderno escudo municipal. Não tem mais utilidade porque o jardim é todo aberto, retirado o gradil em 1922. Em frente a essa antiga entrada inaugurara a Prefeitura no dia 1º de Março de 1913 o busto do Mestre Valentim. Bem podiam agora recuar as pilastras, arco e medalhão do pórtico invalido até onde está o busto: seria, ao menos, moldura contemporânea do Artista.
Fonte
- Rosa, Francisco Ferreira da. Rio de Janeiro em 1922-1924. Rio de Janeiro: Typographia do Annuario do Brasil (Almanak Laemmert), 1924. 222 p. (Coleção Memória do Rio 3 - Reprodução).
Veja também
- Passeio Público, por Noronha Santos
- Passeio Público, por Magalhães Corrêa
- Passeio Público, por John Luccock
Mapa - Passeio Público