Rua São Pedro da Cidade Nova, por Noronha Santos
![PIANTA della cittá di S. Sebastiano di Rio de Janeiro. Nápoles [Itália]: Real Litografia Militare, 1844. Acervo digital da Biblioteca Nacional. PIANTA della cittá di S. Sebastiano di Rio de Janeiro. Nápoles [Itália]: Real Litografia Militare, 1844. Acervo digital da Biblioteca Nacional.](/img/bn/bn_Guia-e-Plano-da-cidade-do-Rio-de-Janeiro-1858-Mc-Kinney_cart174224-Pedro-Cidade-Nova.jpg)
RUA SÃO PEDRO DA CIDADE NOVA – Em fins século XVIII, Luiz da Rocha Machado fizera doação ao Senado da Câmara de chãos no caminho projetado, em frente à Rua São Pedro e a partir do Campo de Sant’Ana. Um documento de 26 de julho de 1799 faz referência ao plano de abertura de ruas naquelas terras, serpeadas de valas e canais. Em 1806 resolveu a Municipalidade mandar cordear definitivamente a nova via de comunicação para os mangais de São Diogo, denominando-se na linguagem do povo – caminho que vai para os mangues de São Diogo.
Com a chegada da família real, em 1808, os antigos mangues começaram a receber benefícios da administração pública, aterrando-se numa porção regular os pântanos que impediam o tráfego das carruagens da corte. Levantou-se forte estacaria destinada a conter a invasão das águas na estrada, por onde deveria transitar o príncipe regente. Para evitar possíveis desastres à noite, resolveu a Intendência de Polícia colocar lanternas pregadas em colunas de pedra, que, alimentadas por azeite de peixe, iluminavam a estrada, salvaguardando assim a vida do príncipe e de outras pessoas da corte, quando regressassem ao Paço de São Cristóvão, depois do anoitecer. Daí a denominação de – caminho das lanternas, pela qual ficou conhecida durante algum tempo. Sem nivelamento e frequentemente inundado pelas enxurradas de São Diogo, tornou-se de difícil trânsito o caminho e, mais do que o bonacheirão D. João, disso se queixavam os toma-larguras [1], afortunados serviçais da corte, que à custa de vexatórias extorsões e aposentadorias gozavam vida folgada.
Em 1815 os aterros já proporcionavam à fazenda real escolher local junto à rua então chamada do Aterrado ou Nova de São Pedro da Cidade Nova para instalação de armazéns. Considerando-a prolongamento da antiga Rua de São Pedro da Cidade Velha, Eduardo Teodoro Boesche [2], célebre aventureiro alemão, engajado em 1824 em nosso exército, escrevia em seus Quadros Alternados, que o Aterrado, muito reto, partia em direção a São Cristóvão e era tão extenso que se levava uma hora em percorrê-lo.
Restier Gonçalves em Índices e Extratos de Aforamentos (fasc. I – pág. 77) regista que, ainda em 1824, estava o logradouro sujeito a inundações do mangue e de forma a facilitar a navegação de canoas e a apanha de peixes.
Nivelada em 1831, do rossio pequeno à bica dos marinheiros, contava então um grupo de prédios até pouco além da Rua Bom Jardim (Visconde de Sapucaí). Os sucessivos aterros de brejos justificavam plenamente a denominação de Aterrado dada à rua que, a partir de 1833, teve melhoramentos mais eficientes, notadamente em 1837 e 38. As valas abertas desde 1831, por ocasião das célebres febres de Macacu e a construção e reconstrução de pontes de madeira e de pedra, em 1832, 1839, 1844 e 1845, inauguradas, a primeira em 14 de janeiro e a terceira, em 26 de abril, daqueles anos, muito concorreram para tornar menos insalubre esse trecho da Cidade Nova e ativar, de certo modo, o tráfico comercial com o Bairro de São Cristóvão e a Praia Formosa, onde o francês José Francisco Derémusson abrira um caminho para seges, ligando o seu curtume com a Rua do Aterrado.
Por deliberação da Câmara Municipal, de 18 de novembro de 1869, aprovada por portaria do Ministério do Império de 29 do mesmo mês e ano, teve o nome de Senador Euzébio – significativo preito prestado à memória do conselheiro Euzébio de Queiroz Coutinho Matoso Câmara, nascido a 27 de dezembro de 1812 e falecido a 7 de maio de 1868.
Em 1873, João Batista Viana de Drumond projetara abrir uma grande avenida até o bairro de Vila Isabel – desde a ponte que a Companhia de carris estava a construir no Aterrado. Dez anos depois, o engenheiro Paula Freitas, no Saneamento da Cidade, sugeria igual providência, como necessária ao tráfego de veículos do centro comercial para os novos arrabaldes, que se desenvolviam entre o Andaraí e o Engenho Velho. Data de 1884 a reforma do seu calçamento, por iniciativa do engenheiro Ernesto da Cunha Araújo Viana. Pelo decreto n. 995, de 26 de maio de 1914, desapropriaram-se prédios para o seu alargamento, consoante projeto aprovado a 7 de janeiro de 1907, na administração do prefeito general Francisco Marcelino de Souza Aguiar. Na administração do engenheiro André Gustavo Paulo de Frontin, inaugurou-se a 22 de julho de 1919, esse importante melhoramento, oferecendo o logradouro, desde a Praça da República, excelente perspectiva. Nesse ano o valor venal dos terrenos adquiridos, era de 1:700$ a 2:500$ por metro quadrado, subindo em 1923 de 2:000$ a 3:400$, por metro de testada – o que comprova a valorização trazida pelo alargamento da rua. O prefeito Alaor Prata determinou em 1923 o replantio sistemático da arborização ao lado do Canal do Mangue.
De conformidade com o plano de urbanização da cidade, discriminado em março de 1941 pelo prefeito Dr. Henrique de Toledo Dodsworth, foram desapropriados para a Avenida Getúlio Vargas todos os prédios da Praça da República ao princípio do Canal do Mangue inclusive a Escola Municipal Benjamin Constant. A 10 de novembro daquele ano, estavam ultimadas as demolições do lado da numeração impar, quando se inaugurou o trecho acima referido, formando essa rua e a do Visconde de Itaúna, um largo espaço, à espera de nivelamento do terreno e obras complementares.
Notas do Editor
- ↑ Anderson, em sua Historia do Brazil, cita, a esse respeito, exemplos curiosos. “Os cortesãos do Paço – diz o autor – são apelidados pelos brasileiros de toma-larguras para significar que essas personagens tomam toda a largura das ruas e não fazem cerimônias para atropelar o povo ou atirar o seu carro de encontro à carruagem, liteira ou cavalo de qualquer plebeu que encontrem no seu caminho.” Fonte: Impressões do Brazil no Século Vinte, por Arnold Wright.
- ↑ Eduardo Teodoro Boesche viveu alguns anos no Brasil, como soldado do terceiro Batalhão de Granadeiros, composto por alemães, aquartelado na Praia Vermelha – Rio de Janeiro. Ao retornar à sua pátria publicou um livro de memórias no qual ridicularizava, de forma irritante, os brasileiros e as suas coisas. A frase histórica, e mais contundente, dizia o seguinte: “tudo o que a natureza fez no Brasil é bonito e admirável; tudo o que o homem fez não vale nada”. Fonte: Caros Ouvintes
Fonte
- Anotação de Noronha Santos na introdução do livro Memórias para Servir à História do Reino do Brasil
Imagem destacada
- PIANTA della cittá di S. Sebastiano di Rio de Janeiro. Nápoles [Itália]: Real Litografia Militare, 1844. 1 planta, col., 42,1 x 64,5. Acervo digital da Biblioteca Nacional.
Veja também
- MALTA, Augusto. Praça 11 de Junho - Rio. Rio de Janeiro, RJ: [s.n.], [19–]. 1 foto, gelatina e prata, p&b, 17,3 x 23,3 cm. Disponível em: http://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_iconografia/icon1411486/icon1411486.jpg. Acesso em: 26 ago. 2020. Disponível em: http://objdigital.bn.br/objdigital2/acervo_digital/div_iconografia/icon1411486/icon1411486.html. Acesso em: 26 ago. 2020.
Mapa - Delimitação do bairro Cidade Nova
Fonte: Instituto Pereira Passos - DATA.RIO - Limites de Bairros