Antiga Capela de São Cristóvão, por Charles Julius Dunlop
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A CAPELA de São Cristóvão ficava a beira-mar, tendo sido erigida pelos jesuítas em terrenos da “Quinta dos Padres da Companhia”, como era então conhecida a enorme Fazenda de São Cristóvão, que fazia parte da sesmaria que lhes fora concedida por Estácio de Sá, em 1.º de julho de 1565.
Não se conhece a data em que foi construída; sabe-se, apenas, que já existia em 1627, por ter-se celebrado ali um batismo nesse ano, segundo referências contidas nos assentamentos da antiga freguesia de São Sebastião do Rio de Janeiro.
Junto à capela ficavam as casas de residência dos jesuítas, a senzala dos escravos, que eles possuíam em grande número, a fábrica de farinha de mandioca e, na Ilha Damasceno ou dos Melões (que também fazia parte da fazenda e desapareceu com os aterros da Praia Formosa e adjacências), ficavam os maquinismos para o fabrico de cal de que os padres faziam também grande comércio.
Nessa capela celebravam-se todos os atos religiosos e, por ocasião da semana santa, os escravos saíam em procissão, percorrendo a fazenda e indo visitar a Capelinha de Santana, situada dentro da Quinta da Boa Vista.
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Em 1759, quando os jesuítas foram expulsos de Portugal e seus domínios e confiscados todos os seus bens, a Capela de São Cristóvão foi também sequestrada, ficando confiada à guarda de Joseph Fernando Machado, rendeiro da fazenda, conforme consta do auto de arrecadação a que, naquela época, procedeu o Desembargador de Agravos da Relação, Dr. Manuel de Afonseca Brandão.
Permanecendo assim fechada, arruinou-se com o correr do tempo, até que, muitos anos depois, no reinado de Dom Pedro I, foi restaurada e modificada a sua fachada.
A respeito dessa reconstrução, conta A. G. Pereira da Silva, saudoso provedor da Irmandade do Santíssimo Sacramento da Freguesia de São Cristóvão, a seguinte história:
A Marquesa de Santos, então favorita de Dom Pedro I, desejava ouvir missa aos domingos e dias santificados, mas não havia igreja nas vizinhanças de sua residência (atual Avenida Dom Pedro II n.º 283 293, cujo prédio ainda ali se conserva (1), a não ser a capelinha da Quinta da Boa-Vista, que era privativa da família imperial.
Lembrando-se da velha igrejinha de São Cristóvão, situada a pouca distância do seu palacete, conseguiu convencer o Imperador de mandar restaurá-la, pois estava fechada, em completo abandono, já tendo falecido o seu guarda e depositário.
Dom Pedro, cedendo aos caprichos da Marquesa, providenciou as obras, dando como pretexto a necessidade de servir o templo para celebração de missas a que devia assistir o Regimento de Caçadores, antiga guarda do Rei Dom João VI, aquartelado nas proximidades.
Terminados os reparos, o Imperador mandou cobrar a quantia de cinquenta contos ao Senado da Câmara. Como este não tivesse sido ouvido a respeito dessas obras, quis, a princípio, recusar o pagamento; mas, para não estabelecer conflito com o monarca, cujas decisões eram inabaláveis, acedeu afinal aos seus desejos…
A gravura mostra a antiga capela de São Cristóvão, com as armas do Império no pórtico.
Em 1891 – já na República, portanto – foi demolida, aproveitando-se algumas paredes que ofereciam solidez e, em seu lugar (hoje Praça Padre Séve), levantada a Matriz de São Cristóvão, em estilo gótico-romano.
Da velha capela construída pelos jesuítas nada mais existe, a não ser as imagens do padroeiro e um pequeno sino da torre.
Nota do Editor
- ↑Inaugurado em 12 de março de 1979, o Museu do Primeiro Reinado situa-se no bairro de São Cristóvão, instalado no palacete que pertenceu à Marquesa de Santos, que ali viveu de 1826 a 1829 (RioTur).
Fonte
- Dunlop, Charles Julius. Rio Antigo. 3ª Tiragem ed. Rio de Janeiro: Editora Rio Antigo, 1963. (Composto e impresso na Gráfica Laemmert, Ltda.).
Imagem destacada
- Igreja de Nossa Senhora do Socorro - São Cristóvão - P. G. Bertichem - 1856.
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