O movimento precursor de Filipe dos Santos. A capitania das Minas Gerais; Sistema de arrecadação do quinto do ouro

Entre os movimentos precursores de emancipação política do Brasil, considera-se o de 1720, de Filipe dos Santos Freire, um de seus principais cabecilhas.
Governava então a capitania das Minas Gerais Dom Pedro Miguel de Almeida Portugal e Vasconcellos, Conde de Assumar, que tomou posse do cargo, em São Paulo, a 4 de Setembro de 1717, e fez entrada solene em Vila Rica a 1 de Dezembro seguinte.
Compreendia no século XVIII o Brasil os Estados do Maranhão e do Brasil, propriamente dito, abrangendo quatorze capitanias, sendo seis gerais: Pernambuco, Bahia, São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso e seis menores – Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Sergipe del Rei, Espírito Santo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Primitivamente, o território do atual Estado de Minas Gerais fazia parte das capitanias de Porto-Seguro, Ilhéus, Espírito Santo, Paraíba do Sul e São Vicente; e uma pequena parte do triângulo mineiro ficava fora da linha de Tordesilhas, pertencente, portanto, à Espanha, se houvesse prevalecido esse pacto diplomático.
Criada a capitania de São Paulo e das Minas do Ouro, em 1709, independente da do Rio de Janeiro, assim se conservou aquela capitania até 1720, quando passou a constituir Minas Gerais um governo colonial à parte.
Assumindo o governo em 1717 o Conde de Assumar reduziu a 25 arrobas de ouro a contribuição das Câmaras Municipais.
Por lei de 1719, Dom João V criou quatro casas de fundição, em Vila Rica, Vila Real, Vila do Príncipe e Vila de São João.
Em virtude dessa lei, de 11 de Fevereiro de 1719, todo o ouro extraído das minas deveria ser levado a essas casas para aí ser fundido e quintado.
Além das despesas de fundição e da cobrança do quinto, pagavam-se ali as taxas e contribuições outras, entre as quais a destinada aos alfinetes da rainha.
Foi proibida, então, a circulação do ouro em pó, única moeda em uso na capitania, que facilmente se fragmentava para atender aos diferentes valores das transações, o que já não sucedia com o ouro em barra, como exigia a nova lei.
Embora fosse tal sistema o mais equitativo em matéria de arrecadação, afora o já citado inconveniente, devendo cada qual contribuir na medida da quantidade do ouro extraído, foi, entretanto, o que piores resultados produziu.
Dele, aliás, só se poderiam queixar os grandes exploradores das minas, e que maiores lucros auferiam com o desvio do ouro.
Não obstante, ao povo sofredor com a derrama, esse sistema beneficiava.
A carta régia de 19 de Março de 1720 mandou instituir a casa da moeda das Minas Gerais, e por esse motivo, a 28 de Junho de 1720, irrompeu, em Vila Rica, uma sedição de caráter libertário.
Os conspiradores, do Arraial do Ouro Podre, onde era chefe influente o mestre de campo Paschoal da Silva Guimarães, às 11 horas da noite, amotinados, atacaram a casa do ouvidor, seguindo daí para a Vila do Carmo (hoje Cidade de Mariana), onde foram postar-se em atitude agressiva em frente ao palácio do Conde de Assumar.
Sem meios de reagir e sufocar de pronto o levante, o governador simulou capitular sem resistência, cedendo a todas as exigências e firmando com os rebeldes, a 2 de Julho de 1720, um acordo, pelo qual se comprometia a suspender a instalação das casas de fundição do ouro e a indultar a todos, com o antecipado perdão real.
Mas tanto que se viu livre do perigo imediato, agiu Assumar nas trevas e com arte maquiavélica; fez requisitar sorrateiramente a força militar de que necessitava, e, de surpresa, mandou prender os cabeças do motim.
Eram eles, além de Paschoal da Silva, chefe do Arraial de Ouro Podre, que foi um dos fundadores de Ouro-Preto, o Dr. Manoel Mosqueira da Rosa, antigo ouvidor; Sebastião da Veiga Cabral, ex-governador da Colônia do Sacramento; Frei Vicente Botelho, filho do Dr. Mosqueira; Frei Francisco de Monte Alverne; e entre todos, se destacava Filipe dos Santos Freire, que dirigiu e excitou o povo a marchar sobre a Vila do Carmo.
O governador seguiu depois com seus dragões para Vila Rica, e mandou incendiar o Arraial do Ouro Podre.
Durante um dia inteiro, lavrou o fogo e ardeu tudo.
Filipe dos Santos achava-se em Cachoeira do Campo, sublevando o povo, quando foi preso e conduzido à Vila Rica, julgado sumariamente, e enforcado na praça pública.
Decido o corpo do patíbulo, mandou o Conde de Assumar arrastá-lo, cruelmente, pelas ruas, atado à cauda de um cavalo selvagem, sendo depois ainda esquartejado.
Esse foi, de fato, o herói da revolta de 1720, “chefe tribuno do povo”, segundo o conceito de Diogo de Vasconcellos; “o mais diabólico homem que se pode imaginar; o agente por que o povo se movia e que fez coisas inauditas nos motins”, na expressão do próprio Assumar.
Como recordação desse drama histórico, existe em Ouro Preto, no lugar em que foi Ouro Podre o denominado Morro da Queimada, situado na encosta de uma serra, hoje em ruínas, muros de pedras, velhos e enegrecidos, cobertos de vegetação, há mais de dois séculos.
Uma das cláusulas do ajuste assinado com os revoltosos pelo Conde de Assumar, na então Vila do Carmo, constava na estipulação de que as companhias de dragões haveriam de comer “à custa dos seus soldos, e não à custa dos povos”.
Não havendo quartéis, eram, por esse tempo, os soldados distribuídos e aboletados pelas casas dos particulares, que tinham ainda de fornecer-lhes comida.
O movimento de Filipe dos Santos é uma das fontes históricas do surto nativista no Brasil que teve por etapas a Inconfidência Mineira e o Sete de Setembro.
Em consequência desse motim separou-se da de São Paulo a Capitania das Minas Gerais.
A casa da moeda da Cidade da Bahia de Todos os Santos fora fundada pela carta régia de 18 de Março de 1714. Só dez anos depois, a 15 de Janeiro de 1724, foi definitivamente instalada a casa da moeda em Minas Gerais.
A lei de 11 de Fevereiro de 1719 havia concedido que no distrito das Minas Gerais corresse ouro em pó.
Por motivo dos abusos constantes que se praticavam no descaminho desse ouro, foi pela carta régia de 19 de Março de 1720 decretado que naquele distrito só passasse a circular o ouro em barra, devidamente fundido, quintado, marcado com um M (Minas) na forma da lei, em moedas e meias moedas e quartos com o respectivo valor em quilates, e na mesma forma das que eram cunhadas no Rio de Janeiro, e traziam inscrito um R.
Quadro Sinótico
A emancipação política do Brasil assinala-se em uma de suas origens, pelo movimento de Filipe dos Santos Freire, em 1720 (Ouro Podre e Vila do Carmo, Mariana) em Minas Gerais, governando então esta capitania, o Conde de Assumar, Dom Pedro Miguel de Almeida Portugal e Vasconcelos.
Os outros conspiradores foram: o mestre de campo Paschoal da Silva Guimarães, um dos fundadores de Ouro Preto; o Dr. Manoel Mosqueira da Rosa, antigo ouvidor, Sebastião da Veiga Cabral, ex-governador da Colônia do Sacramento; Frei Vicente Botelho, Frei Francisco de Monte Alverne.
Deu ensejo ao levante a carta régia da instituição da casa da moeda das Minas.
Fracassada a insurreição, o cabecilha Filipe dos Santos foi preso em Cachoeira e teve uma sentença cruel, foi enforcado; o cadáver arrastado pela cauda de um cavalo selvagem e esquartejado. Em consequência dessa tentativa libertária, operou-se a separação da capitania de Minas Gerais da de São Paulo.
Nota
- Ponto 15º – Lição 38ª
Fonte
- Fleiuss, Max. Apostilas de História do Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1933. 467 p. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Volume Especial.
Imagem destacada
- Estudo do pintor Antonio Parreiras (1860-1937) para o quadro Julgamento de Felipe dos Santos, pintado em 1923 sob encomenda do governo de Minas Gerais. O quadro foi destruído em 1959 no incêndio na Assembleia Legislativa em Belo Horizonte. Governo do Estado do Rio de Janeiro/Secretaria de Estado de Cultura/Fundação Anita Mantuano de Artes do Estado do Rio de Janeiro – Funarj/Museu Antonio Parreiras, Niterói (RJ). Fonte: Scielo - Instituto de História/Universidade Federal Fluminense.
Mapa - Igreja de Santana, Morro da Queimada, Ouro Preto, MG.